Por Emerson Santiago
Regime Militar é reconhecido no período em que vai de 1964 a 1985, onde o país esteve sob controle das Forças Armadas Nacionais (Exército, Marinha e Aeronáutica).
Neste período, os chefes de Estado, ministros e indivíduos instalados nas principais posições do aparelho estatal pertenciam à hierarquia militar, sendo que todos os presidentes do período eram generais do exército.
Era denominada “Revolução” em sua época, sendo que os principais mentores do movimento viam o cenário político do início dos anos 60 como corrupto, viciado e alheio às verdadeiras necessidades do país naquele momento. Assim, o seu gesto era interpretado como saneador da vida social, econômica e política do país, livrando a nação da ameaça comunista e alinhando-a internacionalmente com os interesses norte-americanos, trazendo de volta a paz e ordem sociais. Os antecedentes do Regime Militar podem ser encontrados no período Vargas, entre os responsáveis pela sua derrubada em 1945, pondo fim ao Estado Novo.
Este contingente de oposição se agruparia logo depois na UDN, União Democrática Nacional, partido de orientação liberal-conservadora. Com a volta de Getúlio por meio de eleições diretas em 1951, tal grupo continuaria fazendo oposição à sua política, considerada “populista”. Tal pressão acabaria por provocar o suicídio do presidente. Este gesto, apesar de frear o movimento das forças conservadoras, não impediu algumas tentativas, em especial a manobra para que o presidente eleito Juscelino Kubitschek não tomasse posse. Uma intervenção de um grupo militar não-ortodoxo garantiria a posse de Kubitschek.
Eleito Jânio, parecia finalmente que as forças que dariam respaldo aos militares subiria ao poder, mas, o temperamento ímpar do novo presidente, e sua surpreendente renúncia implodiriam o projeto conservador. Outra vez as ideias de Vargas estariam representadas por um de seus mais aplicados discípulos, João Goulart, que tinha o talento de atrair a repulsa de todos os movimentos um pouco mais à direita do espectro político. O medo de que Goulart implantasse no Brasil uma república sindicalista com o apoio discreto do Partido Comunista Brasileiro acabou lançando a classe média contra o presidente, entendendo que o Brasil caminhava para o caos do socialismo operário e campesino.
Do mesmo modo que acreditavam estarem mantendo a legalidade ao garantir a posse de Juscelino, quase dez anos antes, os militares decidiram entrar em cena novamente. Agora, a deposição do presidente asseguraria a ordem e a legalidade. Na noite de 31 de março para 1 de abril de 1964 começa então um período de exceção, arbitrariedade, desrespeito aos poderes estabelecidos, aos direitos dos cidadãos, à sua integridade física, bem como sua liberdade de expressão. Certos de que realizavam um gesto de “purificação” do poder, o projeto de aparência edificante dos militares descamba para a repressão de toda uma nação.
A Constituição seria rasgada, o judiciário perderia sua independência, e pior, os membros do legislativo seriam depostos de seus cargos como representantes legítimos do povo. A ideia era de que quando o Marechal Humberto Castelo Branco assumisse o poder, logo o devolveria a um representante civil, garantindo mesmo as eleições previstas para 1965. Castelo Branco pertencia ao grupo moderado do movimento, chamado de “Grupo de Sorbonne”.
Logo, porém, os radicais assumiriam o controle do movimento, forçando a permanência dos militares no poder, em plena crença de que os entes responsáveis pelos males políticos do país ainda poderiam voltar a comandar o país. É por obra dos radicais que ocorre a posse de Costa e Silva como segundo presidente militar, e onde se inicia o período mais pesado da repressão. Das perseguições a parlamentares da gestão anterior, os militares decidiram fechar o Congresso Nacional em 1968, através do infame Ato Institucional número 5. Costa e Silva morre em pleno mandato, e mais uma vez o grupo radical conspira para que o vice presidente, Pedro Aleixo, um civil, não assuma; no lugar, o poder seria entregue a uma Junta formada por três militares, um de cada força.
A repressão chegaria ao seu auge com o presidente seguinte, Emílio Médici, que acaba com qualquer movimento armado da oposição, dando a ideia da completa predominância e popularidade do regime, sob pleno “Milagre Econômico”, em meio à conquista definitiva da Taça Jules Rimet na Copa do México de 1970 .
Ao aproximar-se a Primeira Crise do Petróleo, sobe ao poder justamente o presidente da Petrobrás, General Ernesto Geisel, confrontado com o disparo da inflação e fim do milagre. Moderado, ele é incumbido de preparar a volta à normalidade, fazendo a distensão “lenta, gradual e segura”. Apesar de casos infames como a morte do jornalista Vladimir Herzog e do operário Manuel Fiel Filho, Geisel parece conseguir seu objetivo, entregando o poder ao último general da era militar, João Batista Figueiredo.
Apesar da crise econômica, que começava a atingir níveis insuportáveis, da concreta “quebra” do Brasil no plano econômico, e da impunidade de vários personagens da época da repressão, Figueiredo irá, depois de 21 anos de ditadura, transferir o poder a um civil, ainda indiretamente eleito: Tancredo Neves, que morre antes de subir ao poder. Seu vice, José Sarney, proveniente dos quadros políticos da ditadura, acabaria incumbido de guiar o país até as tão esperadas eleições diretas em mais de 25 anos, previstas para 1989.
Censura na ditadura militar
Mestre em Educação (UFMG, 2012)
Especialista em História e Culturas Políticas (UFMG, 2008)
Graduada em História (PUC-MG, 2007
Os meios de comunicação sempre tiveram papel importante para a formação da opinião pública. Por isso, regimes autoritários, como o que vigorou no Brasil entre 1964 e 1985, procuram ter controle sobre suas atividades, a fim de garantir que esses veículos de informação não desestabilizem seu poder. Chamamos esse controle sobre as informações que circulam em uma sociedade (notícias, críticas, músicas, publicações etc.) de censura e ela foi uma das principais características da ditadura militar no Brasil.
Esse controle sobre a opinião pública e sobre todas as áreas da vida social contou com diversos órgãos, tais como o Serviço Nacional de Informações (SNI) e o Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), que compunham as engrenagens de um sistema de desmobilização popular e de perseguição à dissidência a partir da repressão política, da censura e até mesmo da tortura. A Lei de Imprensa (1967) também contribui para o controle das informações veiculadas pela imprensa nacional, prevendo severas punições a jornalistas e meios de comunicação.
O combate ao comunismo, pregado com veemência pela oposição de Jânio Quadros e João Goulart é fundamental para se compreender a censura empreendida durante o regime militar. Nos primeiros dias de instalação da ditadura, o jornal Estado de São Paulo já dava provas de que o medo comunista perpassava o imaginário social de parte da população daquela época: “[…] Enquanto não se concluir a erradicação do comunismo, não se poderá dizer que tenhamos voltado à normalidade legal e à tranquilidade e a segurança da vida democrática. […]” (O Estado de São Paulo, 4/4/64, p.3 apud PAES, 1995, p. 34).
Antes mesmo da eleição indireta que elegeu Castelo Branco o novo Presidente da República, mais de 400 cassações já haviam sido realizadas, buscando retirar da vida política todos aqueles que representassem perigo à permanência dos militares no poder. Nesse contexto, a maior parte dos veículos de comunicação ainda apoiavam o Golpe de 1964, sendo poucos os que se pronunciaram contra o governo desde suas primeiras ações (como o Correio da Manhã) e, por isso, sofreram sérias represálias. Devido a esse controle da imprensa, os diversos intelectuais e figuras públicas que pronunciavam-se contra a ditadura tiveram um espaço de manifestação de suas ideias bastante restrito e sem grandes repercussões inicialmente.
Ao longo do tempo, jornalistas contrários ao regime militar encontraram no humor uma forma de manifestar sua insatisfação criando quadrinhos e charges. Outra forma encontrada para tentar burlar a censura foi a imprensa alternativa cujas publicações também sofreram repressão. Músicas e peças teatrais que criticam o governo também sofreram censura e, diante dela, encontraram formas de burla-la através de diferentes recursos linguísticos que caracterizam a música de protesto.
A censura só foi encerrada, de fato, com o fim da ditadura militar, mas as produções que surgiram naquele contexto não permitem que essa realidade seja apagada de nossa História.
Jornalismo no Regime Militar
Por Daniel Santos de Castro.
Fosse uma peça de teatro, ou uma ficção de cinema, seria certamente um drama longo e triste. Porém, se tratando de fato verídico, a história se mostra ainda mais obscura.
Esse brado era sonhado por jovens em todo o território nacional. A liberdade de fazer o que bem entendesse, ainda que para época, isso significava, muitas vezes, apenas expor suas opiniões em relação ao Estado, era um desejo distante. Ao contrário, viviam algo mais parecido com um pesadelo.
O Brasil, que jamais havia exprimido total liberdade em sua história desde a colonização, sofreu. O país esteve completamente controlado, nas mãos de um governo ditatorial, militar e desumano por longos 21 anos.
Tudo isso aconteceu faz pouco tempo, a mudança foi drástica. O Brasil vinha de um governo com tendências populares, haviam propostas mais sociais de inclusão e divisão de terras. Isso desagradou algumas pessoas, principalmente das classes mais abastadas, então, mais precisamente em 1964 o governo foi tomado por militares. As ruas das principais cidades do país exibia todo o poder bélico, em uniformes de guerra que a partir daquele momento eram responsáveis por governar o destino do Brasil.
10 dias após a tomada estava instaurado o primeiro ato.
O Ato Institucional nº 1, suspendendo as garantias constitucionais estabeleceu eleições indiretas e o Executivo passou a ter direito de cassar mandatos políticos e decretar estado de sítio, sem consultar o Congresso.
“Acender as velas. Já é profissão. Quando não tem samba, tem desilusão” Zé Keti. 1965.
Em 1965, foi editado o AI-2, que permitia a intervenção do governo nos estados e municípios e que só Executivo legislasse através de “Decretos-Lei”. Também extinguiu os partidos políticos e cancelou seus registros. A partir daí, passaram a existir apenas 2 partidos, a ARENA (Aliança Renovadora Nacional) e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro).
“O sol se reparte em crimes, Espaçonaves, guerrilhas. Em cardinales bonitas. Eu vou” Caetano Veloso. 1967.
O Ato Institucional nº 3 foi decretado logo em seguida, acabando ainda mais com a democracia no país. Estabelecia o fim das eleições diretas para governadores e prefeitos das capitais. A partir de então os governadores seriam indicados pelo presidente para a aprovação das assembleias Legislativas. E os prefeitos seriam indicados pelos governadores.
“Caminhando e cantando. E seguindo a canção. Somos todos iguais. Braços dados ou não. Nas escolas, nas ruas, campos, construções.” Geraldo Vandré. 1968.
Decretou-se também o Ato Institucional nº 4, que dava ao governo poderes para elaborar uma nova Constituição.
“Me dê um beijo meu amor. Eles estão nos esperando. Os automóveis ardem em chamas. Derrubar as prateleiras. As estátuas, as estantes. As vidraças, louças, livros, sim.…” Caetano Veloso. 1968.
Aí em 1968 milhares de pessoas foram as ruas protestar, insatisfeitas com a repressão, que até aí já havia oprimido muitas vidas, muitas pessoas sumiram sem deixar notícias.
Em resposta o Congresso Nacional foi fechado e a 13 de dezembro de 1968 foi editado Ato Institucional nº 5, o mais severo de todos. O AI-5 dava ao presidente da República poderes totais para perseguir e reprimir as oposições. Podia decretar estado de sítio, intervir nos estados e municípios, cassar mandatos e suspender direitos políticos, demitir funcionários, confiscar bens. Tamanho era o poder do presidente que seus atos não podiam sequer ser submetidos à apreciação do Judiciário.
A Junta Militar governou durante 2 meses, de 31 de agosto à 22 de Outubro de 1969. Nesse curto período, alterou profundamente a Constituição de 1967, dando origem ao novo texto constitucional de 1969, que reforçava ainda mais o poder do Executivo, o mandato presidencial era de 5 anos, foram mantidos todos os atos institucionais decretados depois de 1967, foi estabelecida a pena de morte e o banimento do território nacional para os casos de subversão.
A partir de esse momento, o Brasil vivia o mais intenso período de repressão e censura que aniquilava toda forma de oposição, fosse ela política, cultural ou qualquer outra possível manifestação popular indesejada. Estavam instaurados os “anos de chumbo”.
Certamente é um grande paradoxo o que ocorreu na posição jornalística daqueles anos. Grande parte dos maiores meios de comunicação da época apoiaram o golpe e deferiam fortes críticas ao governo que estava em vigência anos antes e por consequência geraram mais apoio popular à tomada de poder dos militares. Algumas manchetes podem ser citadas:
- Diário de Piracicaba (SP), 2 de abril de 1964: “Cessadas as operações militares: A calma volta a reinar no país”.
- Diário do Paraná, 2 de abril de 1964: “Povo festejou na Guanabara vitória das forças democráticas”.
- O Dia, 3 de abril de 1964: “Fabulosa demonstração de repulsa ao comunismo”.
- O Estado de S. Paulo, 2 de abril de 1964: “Vitorioso o movimento democrático”.
Porém haviam também os jornais que não apoiavam o golpe, esses já começaram a sofrer censuras desde o primeiro dia pós golpe como indica Nelson Cerqueira, que foi plantonista do Jornal da Bahia. Segundo ele, por volta das 3 da manhã, no dia primeiro de abril de 1964, oficiais do exército entraram no jornal, solicitaram verificar a capa e exigiu que a manchete muda-se seu título. Antes “Rebelião contra o governo”, para “A nação que salvou a si mesma do julgo comunista”. Impossibilitado de realizar as mudanças no momento, o jornal no dia seguinte rodou com um espaço em branco na manchete. Era o princípio de uma era de silêncio induzido.
Nota-se que desde o primeiro momento, já estava instaurada a censura. Porém foi depois do Ato Institucional nº 5 que a censura se intensificou a níveis insuportáveis. Tomados do poder absoluto que o AI5 propunha, o Estado e seu exército de informantes exigia que todo e qualquer meio de comunicação tivesse sua pauta previamente aprovada antes de ir ao ar.
Com isso passa a ser normal ver jornais com páginas inteiras em branco ou até divulgando receitas completamente desbaratadas, que nunca resultavam em um alimento digno.
O governo era claro em seu ordenamento e assim controlavam a população e o acesso a informações. Isso é ilustrado por um telegrama recebido em Brasília, no jornal Estado de S.Paulo, em 1972:
“De ordem do senhor ministro da Justiça fica expressamente proibida a publicação de: notícias, comentários, entrevistas ou critérios de qualquer natureza, abertura política ou democratização ou assuntos correlatos, anistia a cassados ou revisão parcial de seus processos, críticas ou comentários ou editoriais desfavoráveis sobre a situação econômico-financeira, ou problema sucessório e suas implicações. As ordens acima transmitidas atingem quaisquer pessoas, inclusive as que já foram ministros de Estado ou ocuparam altas posições ou funções em quaisquer atividades públicas. Fica igualmente proibida pelo senhor ministro da Justiça a entrevista de Roberto Campos.”
Esse cenário levou um grupo de profissionais a investir em outro filão. Surgiram diversos meios alternativos de veiculação de notícias. E um dos precursores desse momento foi Millor Fernandes que em 1964 lança a revista Pif Paf. Essa congregava um número grande de artistas e sua obra em geral criticava os valores da sociedade burguesa e os excessos (perseguições, desaparecimentos e relatos de tortura) do recém-instalado regime militar.
Entre os veículos alternativos que circularam no período militar, 3 são de maior destaque. São o Opinião, Movimento e O Pasquim. Os dois primeiros de conteúdo apresentado de forma mais séria. E o último foi o que de fato causou maior dor de cabeça ao Estado. O Pasquim nasceu em 1969 no auge da efervescência do AI5 e criticava de forma irônica, satirizando os fatos que ocorriam naquele momento.
Diversos foram os jornalistas que morreram e desapareceram nesse período e o Estado foi responsável por essas mortes, embora não tenha sido responsabilizado por muitas delas até hoje. Porém uma delas marcou um momento em que a mídia internacional se mobilizou e o povo brasileiro começa então sua luta contra a ditadura. Foi a morte de Vladmir Herzog.
A partir desse momento, a luta internacional por direitos humanos na América Latina, volta seu foco para o Brasil e o povo vai as ruas começar os protestos pela liberdade.
O processo de redemocratização iniciou em 1974 e levou 10 anos para se concluir. Em 1984, milhões de brasileiros foram as ruas e iniciaram o movimento Diretas Já, que pedia a eleição direta para presidente. O pedido não foi atendido. Tancredo Neves foi escolhido pelo colégio eleitoral como novo presidente. Morreu antes de tomar posse, fazendo presidente seu vice, José Sarney. Em 1988 uma nova constituição foi aprovada no país, trazendo, enfim, de volta a democracia.
Bibliografia:
CASTRO, Leonardo. O Regime Militar de 1964. Disponível em: < http://novahistorianet.blogspot.com/2009/01/o-regime-militar-de-1964.html> Acesso em: 07 jul. 2011.
indeterminado. A Ditadura Militar. Disponível em: <http://www.culturabrasil.pro.br/ditadura.htm> Acesso em: 07 jul. 2011.