POR: Wagner Geminiano
Doutor em História pelo PPGH-UFPE.
Uma comoção tomou conta do país e do mundo por conta da execução da vereadora do PSOL do Rio de Janeiro, Marielle Franco. Sua morte repercutiu, deu visibilidade rápida e imediata a causas de difícil trato pela sociedade brasileira, a exemplo da crescente violência policial sobre comunidades pobres e periféricas, a mortandade da juventude negra e pobre, o papel e a articulação entre polícia, milícias, políticos e traficantes pelo controle do crime organizado no Rio.
Marielle era uma voz que denunciava e combatia tudo isso, além de se colocar frontalmente contra a intervenção federal no Rio. Foi executada de forma impiedosa. Uma saraivada de cale-se a executou. Mas não bastou a sua morte física.
Em seguida às milícias, as patrulhas de internet instrumentalizadas pelo odio e pela ignorância disseminados pelos mesmos grupos que, certamente, estão por trás de sua execução, começaram a tratar de silenciar os sentidos, significados e simbolismo de sua luta, de sua voz.
Quase sempre afirmando que uma mulher negra, lésbica, favelada e ativista social não pode e não deve, jamais, causar comoção em todo um país, ainda mais defendendo as causas que defendia.
Uma morte negra não poderia causar mais comoção que a morte de um branco. As redes sociais se inundaram de comparações descabidas com outras mortes de pessoas brancas.
Mal disfarçavam o incômodo, o preconceito e a tentativa atroz de retornar aquela negrinha atrevida ao seu lugar. É essa a vontade, é esse o desejo presente em todos àqueles que fizeram e fazem este tipo de comparação.
Uma “defensora de bandidos” não pode causar uma comoção como esta. Tratam rapidamente de deslegitimar sua luta, suas pautas.
Acusam-na de ser favelada e, portanto, de está envolvida com o crime e com àqueles que supostamente a executaram. “Colheu o que plantou”, “mereceu” dizem alguns com benevolente espírito cristão. Marielle, por sua cor, condição social e ideias jamais poderia causar comoção no país e, sobretudo, ter a visibilidade e a repercussão que passou a ter.
Hoje estes grupelhos, de caráter eminentemente fascista, tratam de matá-la mais uma vez, buscando invisibilizá-la e silenciá-la. Deslegitimando-a como pessoa, buscando qualquer argumento que justifique sua execução, mesmo que para isso seja preciso mais uma sarivada de balas, agora disparadas pela artilharia virtual das fakenews, alimentadas pelo ódio e pela ignorância.
Marielle tem de morrer de vez. Marielle tem de ser executada sempre. É isso que continua querendo todos aqueles que puxaram o gatilho, que por ação ou omissão puxam gatilhos todos os dias executando milhares de outras Marielles.
É ai que reside a força, o simbolismo de sua luta e a potência política da comoção em torno de sua execução: Marielle não é só Marielle, ela representa milhares, milhões de negros, de pobres, de favelados, de muheres que enfrentam e lutam contra a tragédia cotidiana que é tentar sobreviver, sob estas condições, em um país como o Brasil.
Marielle presente.